Dicas essenciais para atender parto na água com segurança

Nascer na água pode ser muito benéfico tanto para o bebê, quanto para a mulher. Para o bebê, a chegada em um meio aquático promove um nascimento mais suave e tranquilo; Para a mulher, a imersão na água pode proporcionar um maior relaxamento e conforto na evolução do trabalho de parto, melhora da dor, além de trazer benefícios para o períneo.
Muitos profissionais, no entanto, têm medo do parto na água por não terem informações, nem treinamento suficiente para atuar na sua condução de forma segura. Profissionais inseguros acabam não oferecendo essa possibilidade às mulheres que atendem, contribuindo para manter o mito de que parto na água é perigoso, uma possibilidade para poucas mulheres ou que é “moda”. Outra dificuldade que encontramos nessa atuação é que a maioria dos hospitais no Brasil não dispõem de banheira ou, se as tem não permitem o nascimento na água por acreditarem que ele aumenta o risco de contaminação.
O fato é que existem vários estudos que abordam a segurança do parto na água. Desde a década de 70 o médico francês Frédérick Leboyer vem apresentando os benefícios do nascer na água em congressos e palestras em diversos lugares do mundo.
Diferenças do chuveiro e da banheira
O chuveiro é um recurso que pode ser indicado em qualquer momento do trabalho de parto, inclusive no expulsivo. Não existe nenhum problema em o bebê nascer no chuveiro (a não ser molhar a equipe, rs). Na imersão, no entanto, se a mulher está em um trabalho de parto sem ritmo, com contrações curtas e espaçadas, a banheira pode fazer com que as contrações se espacem mais, o que vai retardar o TP. Mas, se essa mulher precisa descansar, o uso da banheira pode ser muito positivo. Isso quer dizer que não existe certo ou errado, o que existe é a necessidade de entender o que cada recurso pode trazer de prós e contras para oferecer aquele que melhor se adequa a cada situação vivenciada no parto.
O bebê não afoga?
Bom, primeiro precisamos pensar na fisiologia do bebê. Eu costumo dizer que o bebê é fechado à vácuo. Dentro do pulmão dele não tem oxigênio, ele respira pelo cordão umbilical. Então se não tem oxigênio circulando ali dentro dos alvéolos, porque eles estão todos colabados ainda, o bebê não vai se afogar. Assim que a cabeça nascer, ainda dentro d’água, ele vai receber a circulação de oxigênio via placenta materna.
Porém, se sair uma pontinha do nariz do bebê pra fora da água, vai entrar ar. Entrando qualquer quantidade de ar vai ter expansão dos alvéolos e aí sim tem troca gasosa, podendo existir uma possibilidade de afogamento, mas que não é comprovada por estudos. Os estudos mostram que que não há diferença entre o Apgar de bebês que nascem em água ou fora da água (na terra) e não há diferença estatística no número de bebês internados em UTI neonatal. Porém, quando eu estou em um atendimento de parto na água, procuro sempre me atentar para que a cabeça no bebê não saia da água e depois volte.
E se a mulher fizer cocô na banheira?
Os fluídos da mulher não trazem danos ao bebê, pelo contrário, trazem resistência. Ter o primeiro contato na vida com as bactérias da mãe é muito benéfico para o bebê. Além disso, gente, mulher em trabalho de parto vomita, faz cocô… não quer isso? Não atenda trabalho de parto! O cocô no parto é fisiológico, se houver fezes na ampola retal, quando ocorrer a saída do bebê, as fezes vão sair. Nesse caso, retiramos da banheira com o auxílio de uma peneira, e pronto.
O que preciso saber para atender parto na água com segurança?
1. Não ofereça garantias: a primeira coisa é que não é possível garantir à mulher que o parto vai acontecer na água já que tudo no parto depende. O nascimento deve acontecer da forma mais segura e, se em qualquer momento for necessário tirar essa mulher da água, precisa ser conversado com ela e explicar o real motivo.
2. A mulher pode parir na posição que desejar dentro da água, no entanto, é difícil realizar algumas manobras, principalmente as relacionadas a distócia de ombro. Caso o profissional tenha dificuldade na realização de algumas manobras, o ideal é tirar a mulher da banheira (ou da piscina) e realizar o atendimento no chão.
3. A temperatura da água é muito importante: é preciso garantir que o bebê não nasça na água fria. Em algumas situações pode ser um desafio manter a água aquecida, especialmente quando utilizada piscina inflável. É preciso acompanhar a temperatura da água constantemente.
4. O monitoramento cardíaco do bebê precisa ser feito constantemente, com o uso de equipamento adequado, à prova d’água.
5. O uso de IPI adequado é muito importante.
6. E lembre-se sempre: se algo trouxe um desconforto para o bebê ou se você não estiver segura, sugira que a mulher saia da água para realizar o atendimento. Converse e explique o real motivo.
Quais são os riscos de o bebê nascer na banheira?
1. Afogamento: conforme citei acima, o afogamento pode ocorrer caso o bebê respire oxigênio e depois volte para a água. No entanto, não há estudos que comprovem que isso realmente aconteça, mas alguns artigos citam essa possibilidade.
2. Distócia de ombro: em caso de distócia de ombro, realizar a manobra dentro da água pode dificultar o atendimento.
3. Hemorragia pós-parto: por mais que a hemorragia possa acontecer com qualquer mulher, se ela acontece na água pode ser mais difícil identificar e oferecer os cuidados. Alguns estudos apontam que a mulher que pari na água sangra menos, porém não é evidência.
4. Risco de contaminação se a banheira não estiver higienizada de forma adequada. Também não há evidência a esse respeito, porém é um assunto bastante discutido entre os artigos que falam sobre parto na água.
Quando temos uma emergência, é fundamental que tenhamos treinamento prévio para saber o que fazer e manter a calma. Quanto mais você tiver o passo e o passo e o treinamento na mente, mais fácil será a condução.
Quem não pode ter parto na água?
Mulheres com analgesia não têm indicação de irem para água após a analgesia.
Cuidados na escolha de piscina de parto
Quando o parto é domiciliar, muitas famílias contam com o apoio das piscinas infláveis, mas é preciso cuidado na hora da compra. A piscina precisa ter três gomos de ar e pelo menos 55 cm de profundidade, com capacidade para 300 lts de água. Os modelos com apenas uma borda de ar não permitem que a mulher encoste e, além disso, derramam água. Para um maior conforto, é interessante que o fundo também seja de ar, mas caso não seja, um edredom no fundo da piscina pode ajudar: edredom, plástico e a piscina em cima. Lembrando que é importante ter bastante toalha e panos de chão na casa.
Dicas de leitura:
:C. Clews, et al., Women and waterbirth: A systematic meta-synthesis of qualitative studies, Women Birth (2019), https://doi.org/10.1016/j.wombi.2019.11.007
Vanderlaan J; Hall P. Systematic Review of Case Reports of Poor Neonatal Outcomes With Water Immersion During Labor and Birth. J Perinat Neonat Nurs Volume 34 Number 4, 311–323. DOI: 10.1097/JPN.0000000000000515
Texto: Karina Fernandes Trevisan
Foto: Flávia Jacob Fotografia